Muito frequentemente, quando começamos um trabalho de mudança em alguma empresa, nos deparamos com indivíduos e equipes que vocalizam suas reclamações para nós, consultores, facilitadores organizacionais.
Executivos dos mais diversos níveis – CFOs, diretores de área, heads de departamentos, gerentes de funções, coordenadores, analistas – reclamam sobre os mais diferentes temas:
• Do quanto não possuem liberdade ou autoridade para fazer o que acreditam ser o melhor para a organização;
• Da falta de feedback do superior imediato;
• Da falta de tempo para cuidar de coisas estratégicas;
• Da dificuldade de balancear as demandas de vida pessoal com os compromissos da vida profissional;
• Da dificuldade de ter uma conversa sem defesas ou barreiras e muitos outros mais.
Ao mesmo tempo, líderes reclamam que seus subordinados não conseguem compreender a dificuldade dos problemas com que se deparam e recebem pouca contribuição para a resolução dos mesmos.
Muita energia é colocada no ato de reclamar, que se de um lado ajuda a diminuir a pressão de quem reclama, também contribui para a dispersão de energia e a contaminação do ambiente de trabalho.
A pergunta que precisamos responder é: Como os líderes podem usar a energia empregada no ato de reclamar para produzir algo positivo para a empresa?
Ninguém reclama à toa. Se há uma reclamação, há uma razão, mesmo que oculta ou subconsciente. Entretanto, o mais comum é que diante de uma reclamação os líderes optem por três caminhos[1]:
• Tentam ser simpáticos, empáticos, e procuram que o outro compreenda o quanto eles enxergam e compreendem a dificuldade da reclamação.
• Considerando que posições de liderança possuem mais informações e visão ampliada, tentam colocar a reclamação numa perspectiva maior, ou considerar outros elementos da situação.
• Sob o impulso do momento, podem tentar resolver os problemas, para que as razões iniciais das reclamações desapareçam.
As alternativas mencionadas acima, apesar de válidas em seus contextos, pouco propiciam a ampliação de aprendizado para os liderados. O líder permanece sob uma posição de responsabilidade pela solução dos problemas, replicando uma relação de dependência[2], como encontramos frequentemente nas relações pai-filho.
Então, como os líderes podem usar as situações de reclamação para gerar um aprendizado na organização e canalizar a energia para um processo de transformação?
Ao invés de confrontar a reclamação, líderes podem usar a energia imbuída na mesma para buscar alternativas. Não importa se a reclamação é justa ou injusta, o que importa é o que move alguém a reclamar. O que de importante mobiliza aquela pessoa a reclamar e colocá-la naquela posição?
Líderes podem criar um espaço que permita[1]:
1. Gerar uma oportunidade para que seus liderados identifiquem o que mais consideram/prezam/valorizam.
2. Dar tempo para que seus liderados avaliem quais são as questões ou princípios em jogo na situação.
3. Ajudar seus liderados a identificar com o que estão comprometidos a fazer em relação às reclamações.
Ao tratar da pessoa que reclama como um potencial agente para a mudança, os líderes contribuem para o desenvolvimento do subordinado, oferecendo-lhe uma oportunidade genuína de rever seus valores e pressupostos, assim como transformar suas ações e influenciar positivamente o ambiente de trabalho.
O líder que resiste à tentação de ser o centro das atenções, puxando para si todas as responsabilidades, enriquece a experiência dos seus liderados, criando oportunidades para aumentar a senioridade dos mesmos.
Ao mesmo tempo, equipes que tornam-se capazes de refletir conjuntamente tendem a desenvolver uma visão sistêmica, ampliam o aprendizado significativo (double loop learning[3]) e aumentam a capacidade de desempenho.
Esse exercício não é trivial, requer que o líder se coloque numa posição de facilitador do aprendizado dos liderados, ajudando-os a desenvolver uma nova perspectiva sobre o contexto em que se encontram. Talvez seja mais fácil prover as respostas para as reclamações ou problemas, mas esse caminho já foi trilhado e sabemos as consequências, certo?
Da próxima vez que alguém reclamar, o que você pretende fazer?
Referências bibliográficas:
1. Kegan, R. and L.L. Lahey, How the way we talk can change the way we work: seven languages for transformation. 2001, San Francisco: Jossey-Bass.
2. Heifetz, R.A., Leadership without easy answers. 1999, Cambridge: The Belknap Press of Harvard University Press.
3. Argyris, C., Double-Loop Learning, Teaching, and Research. Academy of Management Learning & Education, 2002. 1(2): p. 206-218.